Chegada a Portugal
Permanência em Portugal
Partida de Portugal
Fim do exílio
Empenhada desde jovem na resistência contra o nacional-socialismo, Lisa Fittko (1909 – 2005), aliás Elizabeth Eckstein, ficou especialmente conhecida pela sua atividade de passadora de fugitivos através dos picos dos Pirenéus, pela rota que muitos conhecem como “rota F” (de Fittko), na verdade a antiga rota Lister, anos depois rebatizada como caminho Walter Benjamin.
Nascida em Ungvar (à época Império Austro-Húngaro, hoje Ucrânia), filha de um conhecido jornalista de origem judaica e fundador de uma revista socialista, cresce em Budapeste e Viena, mudando-se em 1922 com a família para Berlim. Depois do incêndio do Reichstag (1933), a jovem Lisa foge para Praga, onde conhece Hans Fittko, seu futuro marido, também ele um fugitivo político berlinense. De lá continuam o seu percurso de exílio, em 1938, com breves estadas na Suíça e na Holanda até Paris, sem nunca interromperem a sua atividade política.
Hans e Lisa viviam em Paris, quando a invasão de França, em junho de 1940, a transforma em “estrangeira inimiga”, o que a conduz ao internamento no campo feminino de Gurs, de onde vem a evadir-se, juntamente com outras 60 prisioneiras. Decidida a chegar a Marselha – pensava poder escapar daí por barco –, reúne-se com Hans em Montauban, depois de uma breve estada em Lourdes e de complicadas aventuras. Munidos de passaportes checos, de vistos para atravessar Espanha e Portugal e de vistos ultramarinos para a China, faltava-lhes apenas o visto de saída de França (Weber, 2012:91). Convencidos de que o melhor caminho de fuga para si e para os outros fugitivos (os que os acompanham e outros que se seguirão) será a travessia dos Pirenéus, decidem que Lisa parta para Banyuls-sur-mer, na fronteira franco-espanhola, onde poderão contar com a ajuda de um presidente da câmara socialista para organizar essa rota de fuga. É ele que fala a Lisa de um caminho pela montanha, por onde ela conduziu pouco depois Walter Benjamin, o seu primeiro fugitivo, a pedido deste, sem, infelizmente, poder impedir a morte do filósofo alemão. Contactados nesse sentido por Frank Bohn, representante do A.F.L. (American Federation of Labor) americano e por Varian Fry, representante do ERC (Emergency Rescue Committee) em Marselha, que provia os refugiados com vistos de emergência e dinheiro, os Fittko interrompem a sua fuga, estabelecem-se em Banyuls-sur-Mer com passaportes franceses falsificados e passam a guiar fugitivos (entre eles também aviadores britânicos capturados em França) pela rota da montanha, durante cerca de sete meses (outubro de 1940 ao início de abril de 1941), como Lisa Fittko descreve no seu texto autobiográfico Mein Weg über die Pyrenäen [O meu caminho pelos Pirenéus].
Em outubro de 1941, o número de fugitivos diminuíra na sequência do endurecimento das medidas persecutórias de Hitler. Quando o governo de Vichy proíbe a presença de estrangeiros perto das fronteiras, Lisa e Hans percebem que chegou a hora de partir, mas é cada vez mais difícil obter vistos para o ultramar. Apoiados pelo CAS [Centre Américain de Secours], a organização do ERC em Marselha, e com vistos americanos, eles, que tantas vezes tinham atravessado a fronteira ilegalmente, partem agora providos de documentos legais e seguem de comboio através de Espanha e de Portugal.
Chegados a Lisboa, sabem que o barco em que esperavam viajar se encontrava cheio, o que os obriga a uma espera de algumas semanas. Por fim, embarcam no SS Colonial, onde em condições difíceis, numa terceira classe superlotada, atravessam para Cuba. Em Havana, catorze dias depois, são imediatamente presos num campo de refugiados. Recebem apoio das organizações para ajuda aos judeus (ERC, ORT), embora sempre se considerassem refugiados políticos, e estabelecem relações com uma elite intelectual local, aprendem espanhol e declaram-se de certa forma “aculturados” (Fuechtner, 2018: 130). Apenas sete anos depois conseguirão emigrar para os EUA, instalando-se em Chicago até ao fim das suas vidas, tendo adquirido a nacionalidade americana. Lisa irá trabalhar como correspondente de línguas estrangeiras e como funcionária da universidade, continuando politicamente ativa, empenhando-se principalmente em movimentos pacifistas. Publica Mein Weg über die Pyrenäen. Erinnerungen (1940-1941) [O meu caminho pelos Pirenéus. Memórias (1940-1941)] (1988), Solidarität unerwünscht. Meine Flucht durch Europa: Erinnerungen (1933-1940) [Solidariedade não é desejada. A minha fuga pela Europa: Memórias (1933-1940)](1992) e algumas short-stories autobiográficas, obras que lhe trarão o conhecimento e reconhecimento internacionais, sendo a sua história tratada em biografias, trabalhos académicos, filmes e documentários. Vem a morrer em 2005.
Fittko, Lisa (2015), Mein Weg über die Pyrenäen. Erinnerungen (1940-1941) München, Carl-Hanser Verlag [1985]
Fuechtner, Veronika (2018), «Lisa Fittko´s Passage to Cuba», in: Burcu Dorgamaci/Elizabeth Otto, Passagen des Exils, München, Editions Text+Kritik, 126-140.
Weber, Ronald (2012), Passagem para Lisboa. A vida boémia e clandestina dos refugiados da Europa nazi, Lisboa, Clube do Autor.
(Teresa Martins de Oliveira)
Fittko, Lisa (2015), Mein Weg über die Pyrenäen. Erinnerungen (1940-1941) München, Carl-Hanser Verlag [1985]
– (1992) Solidarität unerwünscht. Meine Flucht durch Europa: Erinnerungen (1933-1940) (1992)
Fittko, Lisa (2015), Mein Weg über die Pyrenäen. Erinnerungen (1940-1941) München, Carl-Hanser Verlag [1985]
Do/a autor/a sobre o exílio