Blei, Franz

Data de nascimento: 18 de janeiro 1871
Local de nascimento: Império Austro-Húngaro (Viena)
Data de morte: 10 de julho 1942
Local de morte: EUA (Westbury, Nova Iorque)
Nacionalidade: austríaca
Confissão:
Artes, Letras e Ciências:
Blei, Franz

 

Exílio

Data de partida: 1932
Local de partida: Berlim
Motivo(s):
Passagem por: Espanha (Maiorca); Áustria (Viena); Itália (Florença, Lucca); França (Cagnes-sur-Mer, Marselha); Espanha

 

Chegada a Portugal

Data de chegada: maio 1941

 

Permanência em Portugal

Tempo de permanência: três meses

 

Partida de Portugal

Data de partida: 1941
Meio de transporte: navio
Destino: EUA (Nova Iorque)

 

Fim do exílio

Data de regresso: ---
Local de regresso: ---
Sobre o exílio

Se bem que hoje praticamente esquecido nos estudos de História da Literatura, Franz Blei ocupou, até aos inícios dos anos 30, uma posição de destaque na vida literária e boémia de Viena e, esporadicamente, de Munique e de Berlim.

Nascido em Viena (18-01-1871) numa família de origem humilde – o pai enriqueceu devido a negócios imobiliários –, Franz Blei, que cedo teve contacto com a língua e cultura francesas graças à perceptora francesa da casa paterna, estudou Economia Política, História e Literatura nas universidades de Viena, Berna e Zurique. Licenciou-se em Berna, em 1895, com uma tese sobre o famoso Abbé Galiani, diplomata e economista do iluminismo italiano.

Com um grande círculo de amizades entre artistas e intelectuais da época, em parte cultivadas nos cafés literários que frequentava regularmente (em Viena, Café Herrenhof e Café Central; Café Stefanie, em Munique; em Berlim, Café des Westens), Blei era um escritor multifacetado, com uma intensíssima atividade literária e grande capacidade de intervenção no mundo das letras, sempre atento a todas as manifestações de modernidade que procurava também em outras literaturas europeias (Correia, 44). Durante as três primeiras décadas do século XX, tornou-se conhecido como ensaísta, editor e redator de revistas, tradutor, leitor e consultor de editoras, descobridor e divulgador de talentos, compilador, bibliófilo, para além de dramaturgo, encenador e, por vezes, ator. Através das obras que traduziu, alertou o público para autores estrangeiros como, entre outros, Choderlos de Laclos, André Gide, Paul Claudel, Oscar Wilde, Nathaniel Hawthorne ou Walt Whitman. Incentivou e divulgou autores que como Hermann Broch, Franz Kafka, Robert Walser, Robert Musil ou Carl Sternheim. Fundou e/ou coeditou cerca de uma dezena de revistas – p. ex., Hyperion (1908-1910), onde foram lançados os primeiros textos de Kafka, ou ainda Summa (1917-1918), de cariz predominantemente filosófico, onde Hermann Broch publicou «Methodologische Novelle» (Novela metodológica), o seu primeiro texto em prosa «para agradar ao meu amigo Blei» (ibidem, 36): «Methodologische Novelle». Franz Blei foi ainda colaborador de mais de duas dezenas de periódicos, como Die Insel (1899-1901) ou Die Aktion (1911-1932), tão importante para a difusão do Expressionismo. Na sua vasta obra destaca-se ainda a edição de textos eróticos, como a compilação de literatura barroca Das Lustwäldchen (1907ss.).  A publicação mais conhecida, original e polémica é, contudo, Das groβe Bestiarium der deutschen Literatur (1920) (O grande bestiário da literatura alemã), onde descreve autores literários importantes do seu tempo – incluindo-se a si próprio – enquanto personagens grotescas. (Muito alargada com novos escritos satíricos, também sobre autores estrangeiros e alguns ensaios sobre literatura contemporânea, existe uma terceira edição, de 1924, intitulada Das groβe Bestiarium der modernen Literatur (O grande bestiário da literatura moderna)).

Todavia, a aproximação de Hitler ao poder acarretou a Blei, que desde cedo frequentara círculos socialistas e repudiava veementemente o nacional-socialismo, um emudecimento literário gradual e um silenciamento em torno de si por parte da cena literária e cultural, acompanhado por um agravamento da sua situação económica e do seu estado de saúde. Logo em 1932, com 61 anos, despede-se de Berlim e inicia um longo e penoso exílio. Acompanhado apenas pela filha Billy (Maria Eva Sibylla, 1897-1962), abandona Berlim rumo a Cala Ratjada, à data uma pequena aldeia piscatória em Maiorca. No ano seguinte, o autor verá o seu nome na lista de obras proibidas de circular devido à política cultural da «literatura do sangue e da terra» vigente no Reich. Já separado da filha – que entretanto se mudara para o sul de Espanha – e temendo a influência crescente da Gestapo na Espanha, o deflagrar da Guerra Civil (1936-1939) ditou o seu regresso a Viena. Dois anos mais tarde, com a anexação da Áustria (12 de março 1938), refugia-se em Itália (Florença, Lucca), depois, entre março de 1939 e finais de 1940, no sul de França (Cagnes-sur-Mer), onde os seus haveres se resumiam a 100 francos, oferecidos, e a «um saco de papel com o pijama e os utensílios de ‘toilette’» (ibidem, 21). E se a ida para Maiorca havia implicado uma quase estagnação da sua produção literária, da atividade editorial e da capacidade de intervir na vida literária (ibidem, 24) – publicou ainda, já no exílio, uma última obra: Zeitgenössische Bildnisse (1940) (Retratos contemporâneos), mas numa editora de Amsterdão –, a fuga de Viena significou cumulativamente uma dependência total e definitiva da ajuda financeira de um círculo de amigos e de admiradores que, todavia, se ia tornando cada vez menor – quer por divergências pessoais, quer políticas e literárias (idem).

Adquiridas em Marselha as necessárias autorizações de trânsito pela Península Ibérica, é no carro de um amigo dos tempos de Munique que Blei viaja para Lisboa (ibid., 22), onde chega por volta de 20 de maio de 1941 (Reinthal, 23). Em Portugal, enquanto espera o navio que o conduzirá a Nova Iorque, reside com a filha, que vivia desde 1937 com Sarita Halpern, na quinta de Santo António, em Lazarim (Costa da Caparica).

Já antes da chegada de Blei a Portugal Sibylla se esforçava, em vão, para que o pai conseguisse sair da França e prosseguir para os EUA. Atestam-no um telegrama dirigido a Thomas Mann (30 de setembro 1940) e, sobretudo, uma carta enviada a Hermann Broch (13 de setembro 1940) (ibidem, 21-22). Quando ele chega, segundo a filha «[c]om um peso leve de fantasma (…), um vagabundo barbudo – não, um hebraico – não, o cadáver vivo de Tolstoi (…)» (ibidem, 23), ela empenha-se em tratar do pai, gravemente desnutrido, andrajoso, e que sofrera menos de meio ano atrás um ataque cardíaco (Correia, 23). A esse zelo de Billy se refere também o próprio autor em carta de 28 de maio de 1941 a Hermann Broch, já residente nos EUA desde 1938 (cf. «Correspondência com referências a Portugal»).

Chegado a Nova Iorque na primeira quinzena de agosto de 1941, Blei vem a falecer depois de cerca de um ano vivido em extrema miséria e solidão. Apenas Hermann Broch o acompanhou nos últimos momentos, e Alexander Roda Roda, também imigrado nos EUA desde finais de 1940, anotou no seu diário que o corpo ficou «durante 9 dias numa câmara frigorífica, até se juntar o dinheiro necessário para o enterro – 160$» (idem).

A biblioteca de Franz Blei foi doada pela família Halpern à Biblioteca Nacional de Portugal.

 

Correia, Maria da Assunção Duarte Pinto (1988) (pref., org., revisão), Uma biblioteca reencontrada. A doação Sibylle Blei/Sarita Halpern na Biblioteca Nacional, Lisboa, Biblioteca Nacional. https://books.google.pt/books?id=DbLzB9YP6FEC&pg=PA45&lpg=PA45&dq=Franz+Blei+exilio+Portugal&source=bl&ots=rUQkp47uu8&sig=ACfU3U0X6-na6Ag8aTEUjDBozdkPulyMLA&hl=pt-PT&sa=X&ved=2ahUKEwip08e68sT2AhVizoUKHWaqALIQ6AF6BAgdEAl#v=onepage&q=Franz%20Blei%20exilio%20Portugal&f=false (acedido 24. 04.2022)

Reinthal, Angela (2011), «Introdução», Uma biblioteca reencontrada. A doação Sibylle Blei/Sarita Halpern na Biblioteca Nacional de Portugal. Catálogo (2.ª parte), trad. Cátia Nogueira, Lisboa, Biblioteca Nacional de Portugal: 11-29.

https://austria-forum.org/af/AustriaWiki/Franz_Blei

(Maria Antónia Gaspar Teixeira)

Correspondência do/a autor/a com referências a Portugal

Carta a Hermann Broch, 28 de maio 1941

Cheguei aqui a L. há oito dias, depois de oito semanas medonhas em Marselha, que me arrasaram os nervos. O meu visto de imigração é válido até 10 de julho, i. é, neste dia tenho de estar já num navio dos EUA. (…) Em resumo, também chegarei a NI. Só não me é muito evidente o que lá devo fazer, falar com o Bruno Cassirer sobre livros ou com a Knopf não é no fundo um assunto que dure meses. Presumivelmente vou chegar com dois manuscritos. (…) Até à minha partida, a Billy empenha-se em me apaparicar, muito necessário depois dos meses de fome na França.

(Angela Rheinthal (2011), «Einführung», in Uma biblioteca reencontrada. A doação Sibylle Blei/Sarita Halpern na Biblioteca Nacional de Portugal. Catálogo (2.ª parte), Lisboa, Biblioteca Nacional: 44.

(trad. de Maria Antónia Gaspar Teixeira)

 

Do/a autor/a sobre o exílio

Citar este verbete como: Maria Antónia Teixeira, "Blei, Franz," em Passagen, Maio 17, 2021, https://passagen.ilcml.com/base/blei-franz/.