Local de chegada a Portugal

Rotas e Fronteiras
Rota Aérea
Lisboa (Sintra e Sacavém)

A chegada às diferentes fronteiras de Portugal de refugiados do regime nacional-socialista faz-se notar a partir da subida de Hitler ao poder (janeiro de 1933), mas o verdadeiro aumento do fluxo migratório é sentido a partir do início da guerra e vai refletir diferentes fases e inflexões do domínio nacional-socialista. O número de refugiados cresce à medida que, com o início da guerra (setembro de 1939), o ataque à Escandinávia (abril de 1940), a invasão da França (maio de 1940) e a sua divisão (junho de 1940), a campanha da Rússia (a partir de junho 1941) e a ocupação da França de Vichy (novembro de 1942) se fecham outras rotas de exílio mais apetecidas (o Transiberiano até Xangai; o caminho através da Hungria e da Jugoslávia até aos portos de Trieste e Génova em Itália ou o porto de Marselha em França. Como porta de passagem para o exílio ultramarino restam abertos praticamente apenas a Península Ibérica e, numa fase posterior, quase só Portugal (o transporte por Cádis e Sevilha era pouco mais que residual) (cf. Weber, 107).
Também as rotas de travessia da Espanha e consequente entrada em Portugal se alteram com o evoluir do conflito. Até à ocupação da França, em 14.6.1940, os refugiados privilegiavam a fronteira de Hendaya/Irun, que experimenta um pico de especial afluência nas últimas semanas do mês de junho de 1940, para o que terão concorrido os célebres vistos passados por Aristides de Sousa Mendes em Bordéus e depois em Baiona. Com a costa atlântica da França controlada pelos alemães, cessa quase completamente a passagem (mesmo a ilegal) por essa fronteira franco-espanhola, enquanto cresce o movimento de exilados legais ou clandestinos pela rota de Cerbère/Portbou (von zur Mühlen, 52). É este trajeto que seguem muitos dos artistas e intelectuais de língua alemã em fuga ao nacional-socialismo, quer aqueles que lograram obter os documentos que lhes permitiam uma emigração legal (autorização de saída de França, visto de trânsito por Espanha, visto de entrada em Portugal alcançável apenas a troco do comprovativo da posse de um visto de entrada para um destino definitivo, por vezes até do comprovativo da compra do bilhete), quer aqueles que, como a maior parte dos exilados do período após a invasão de França, o fizeram ilegalmente.
A maior ou menor facilidade na travessia de Espanha (e também de Portugal) dependia ainda da política de facilitação ou de dificultação da imigração por parte dos EUA e da Grã-Bretanha, replicada por outros países ultramarinos e pelos próprios países ibéricos (v.z. Mühlen, 300). Dependia também, muito especialmente, das diferentes fases da política de perseguição aos judeus feita pela Alemanha e da posição de França em relação a eles. Havia por outro lado aqueles exilados que, judeus ou não, se tinham destacado por atividades consideradas subversivas ou por especial oposição ao regime – eles integravam frequentemente listas de procurados e incorriam, no trajeto até Portugal , em grande perigo de prisão e deportação.
Não é fácil determinar com exatidão o número de refugiados que passaram por Portugal em fuga ao nacional-socialismo, nem, entre eles, quantos eram os intelectuais e artistas de língua alemã. Von zur Mühlen, que faz um levantamento de diferentes propostas, destaca como tendencialmente verosímeis os números avançados pelo Alto Comissariado para os Refugiados da Sociedade das Nações, que é de opinião que o número de exilados judeus que passaram por Portugal entre Junho de 1940 e meados de 1941 seria de 50.000, devendo juntar-se a estes mais cerca de 5 a 8% de não judeus. (v.z. Mühlen, 225). A partir do início de 1942, o afluxo terá diminuído para cerca de 2.000 por mês, com o saldo entre os que chegam e os que partem a rondar os 1.500. Ainda segundo este estudo, o total dos refugiados que por cá teriam passado não chegaria a 80.000.
Se a quantificação dos refugiados é difícil, conhecem-se, todavia, as rotas de chegada e de partida e as fronteiras que privilegiaram, bem como as condicionantes gráficas, temporais, sócio-económicas e políticas que revestiam estas opções.

Pimentel, Irene Flunser (2008), Judeus em Portugal durante a II Guerra Mundial, Lisboa, A Esfera dos Livros.
Schäfer, Ansgar (2014), Portugal e os Refugiados Judeus Provenientes do Território Alemão, Coimbra, Imprensa da Universidade.
von zur Mühlen, Patrick (2012), Caminhos de Fuga Espanha-Portugal. A Emigração Alemã e o Êxodo para Fora da Europa de 1933 a 1945, Coimbra, Imprensa da Universidade.
Weber, Ronald (2012), Passagem para Lisboa. A vida boémia e clandestina dos refugiados da Europa nazi, Lisboa, ClubeAutor.

Rota Aérea
Visando aproveitar a situação geográfica privilegiada de Lisboa enquanto plataforma de ligação entre os voos transatlânticos (que por razões de segurança eram feitos por hidroaviões) e os aviões convencionais que serviam os aeroportos continentais, na década de 30 haviam sido projetados para Lisboa dois aeroportos, um marítimo e outro terrestre. Com o deflagrar da Guerra, a importância das rotas aéreas de e para Lisboa recrudesce, principalmente à medida que as passagens pelos países beligerantes se vão tornando inviáveis (p. ex., a partir do início da Guerra, os clippers da Pan America em viagem para a Europa abandonam a rota do norte, pela Irlanda, mantendo apenas a do sul, que passa a voar somente até Lisboa). Assim, durante a Guerra, a capital portuguesa mantém as ligações aéreas aos EUA e à Europa (Inglaterra, Espanha, Alemanha e, na fase inicial do conflito, Itália e Norte de África (Weber, 113-114), concretizando, por isso, a sua vocação de importante interface entre os EUA e diferentes países da Europa.

Pimentel, Irene Flunser (2008), Judeus em Portugal durante a II Guerra Mundial, Lisboa, A Esfera dos Livros.
Rocha, António (2011), “A Hidroviação Nacional”, in: Voar Ultraleve, Jan/Fev/Març 2011, 7-9.
Schäfer, Ansgar (2014), Portugal e os Refugiados Judeus Provenientes do Território Alemão, Coimbra, Imprensa da Universidade.
Weber, Ronald (2012), Passagem para Lisboa. A vida boémia e clandestina dos refugiados da Europa nazi, Lisboa, ClubeAutor.

Aeroportos da Granja do Marquês em Sintra e da Portela de Sacavém
O aeroporto da Portela vem substituir o Campo Internacional de Aterragem, que até 1940 funcionava no Complexo Militar de Alverca, e que recebia os voos de ligação à Europa. Entre 1940 e a inauguração do Aeroporto da Portela, há também um posto fronteiriço instalado no aeroporto da Granja do Marquês em Sintra, pronto a receber turistas (inaugurara-se em 1940 a Exposição do Mundo Português), refugiados e todos quantos a Guerra faz aportar a Lisboa.
Reveste-se de carga simbólica a lista das companhias cujos aviões pousaram ou descolaram do aeroporto da Portela de Sacavém no dia da sua inauguração solene (19 de outubro de 1942): trata-se de aparelhos da BOAC, da Ibéria, da Lufthansa, da Ala Littoria e da Aero Portuguesa (em trânsito para Tânger) (https://restosdecoleccao.blogspot.com/2012/07/aeroporto-de-lisboa-entre-1942-e-1947.html.
Estes aviões ilustram bem a pretendida (ou pretensa) neutralidade portuguesa, mas revelam também os condicionalismos que se impunham aos refugiados, principalmente aos que integravam as listas de procurados pela Gestapo. Se quisessem viajar de avião da Europa para Portugal, teriam de o fazer num voo da Lufthansa, de reconhecida ligação ao governo nazi, ou da Ala Littoria do governo fascista. É frequentemente citado o caso de Heinrich Mann que viajou de Madrid para Lisboa num voo da companhia aérea alemã sob o nome de Heinrich Ludwig. Todavia, o número de alemães (refugiados e não só) que chegam a Portugal pela rota aérea duplica entre 1940, com 645 passageiros, e 1941, com 1245, o que se ficará a dever à abertura, em Setembro de 1940, da linha aérea Berlim – Lyon – Marseille – Barcelona – Madrid – Lisboa (Schäfer: 221).

(https://restosdecoleccao.blogspot.com/2012/07/aeroporto-de-lisboa-entre-1942-e-1947.html.
Rocha, António (2011), “A Hidroviação Nacional”, in: Voar Ultraleve, Jan/Fev/Març 2011, 7-9.
Schäfer, Ansgar (2014), Portugal e os Refugiados Judeus Provenientes do Território Alemão, Coimbra, Imprensa da Universidade.